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quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Cristo ensinou a negação do ser?

“Então, disse Jesus a seus discípulos: Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me”. (Mateus 16.24).

Esse mandamento sempre me deixou inquieto, me levava à seguinte questão: “Estaria Jesus querendo que a humanidade vivesse uma vida de fuga e de negação? Seria o evangelho uma forma de alienação da vida? Aceitando a leitura tradicional comum, não há o que discutir. Se a interpretação for literal, Freud tem razão quando afirma: “Nossa civilização repousa sobre a supressão das pulsões, sobre a renúncia ao sentimento de onipotência, inclinações vingativas e agressivas”. (1908/1976).

No entanto, Freud também não advoga uma vida sem limites, então como explicar “negar a si mesmo”? Estaria Jesus querendo produzir uma comunidade de neuróticos?

Jesus não era moralista nem legalista, isso é óbvio e fica patente no contraste em diversas passagens principalmente em Mateus em que ele confronta a religião opressora dos fariseus.

A hermenêutica em todo o seu contexto, não só do escrito, mas também sociológico, mostra que a comunidade dos tempos de Jesus era formada por judeus que enfrentavam o antagonismo dos fariseus. A “seita” do nazareno tinha na sua principal mensagem o confronto entre: “Ouviste o que foi dito?” x “Eu, porém vos digo”. (Mt 5. 21ss)

Quem eram os maiores opositores de Jesus? Não eram os componentes da religião dominante, judaismo-farisáico? Ora, negar a sí mesmo seria uma ruptura dos pré-conceitos infligidos pela interpretação literal da lei. Imagine o mandamento: “Não Matarás”. O homicídio era condenado, bastava não matar para jactar-se de cumprir o mandamento da lei.

Jesus, porém, relativiza o termo “matar”, elevando-o a uma dimensão subjetiva, uma ética superior, agora não cometer homicídio, não era suficiente, precisava ir além: “não irar-se contra o irmão”. Enquanto no sistema da religião farisaica quem cometesse homicídio ia a julgamento e pagava com a própria vida, Jesus transpõe o mandamento e diz que para ir a julgamento basta irar-se contra o outro! (Mt 5.20-21).

Se o sermão do monte são ordenanças para o cristão cumprir, logo Jesus piorou o que já não era bom! A justiça do evangelho no reino teria que ir além da ética dos escribas e fariseus: “Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder em muito a dos escribas e fariseus, jamais entrareis no reino dos céus”. (Mt 5.20).

A religião farisaica tinha camuflada uma ética utilitarista: “Os fins justifica os meios”. O altar santificava a oferta, mas no caminho entre o altar e a oferta está o “outro”. Jesus horizontaliza a transcendência, “no percurso entre o altar e a oferta, a dimensão vertical subjuga-se em prol da horizontal, de forma que a importância da oferta (meio), não é justificada pelo fim (altar).

O ofertante deve voltar e reconciliar-se com o “outro”, mais importante do que o “transcedente” (Altar) é o “imanente” (irmão). Dessa forma “Deus” sai do símbolo e se concretiza no outro. (Mt 5.23-24).

Nesse contexto Jesus relativiza todo absoluto: “Não adulterarás” visava normas de convivência, contudo os religiosos jactavam-se de não cometer o ato. Logo, apedrejar o adúltero não somente alimentaria o senso de justiça (hipocrisia social) de um mandamento absoluto, como colocava o executor: “a serviço da justiça divina”. (Jo 8).

Jesus entra em cena, e desarticula todos os pressupostos da religião dominante: “Ouvistes o que foi dito”, “Eu, porém voz digo”. Aquele que desejar no seu coração o ato, já cometeu adultério”! (Mt 5.28).

Ora o que Jesus estava fazendo afinal? Tornando pior o que já não era fácil? Qual seria melhor cumprir o mandamento da lei ou do evangelho? Pense: “Porque ele tornou ainda pior, transformando o delito de um ato concreto, para um “delito” na abstração do desejo?

CONTINUA... PARTE II

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